O sol ainda não havia despontado no horizonte, mas o céu começava a se tingir de tons alaranjados e rosados, anunciando o primeiro dia. Jesus estava só, mas não sozinho. A areia fria sob seus pés era o primeiro toque do deserto, o início de uma jornada que exigiria muito mais que força física – exigiria total entrega.
Ele se assentou sobre uma rocha, os olhos voltados para o nascente, enquanto o silêncio ao redor se misturava ao pulsar do seu coração. Foi então que a voz que criara todas as coisas se fez presente, não como um trovão distante, mas como um sussurro íntimo, familiar:
– Filho, aqui, o tempo se arrasta e os pensamentos se revelam. O deserto é onde as verdades escondidas se tornam claras, e onde os corações são provados.
Jesus respirou fundo, sentindo o ar seco encher seus pulmões. Havia uma serenidade em suas palavras, mas também um peso que se fazia presente.
– Sei que este é o caminho, Pai, mas não há nada aqui. Apenas o vazio e o silêncio.
Deus sorriu, não com lábios, mas com uma ternura que ecoou em cada partícula do deserto.
– Justamente, meu Filho. Foi do vazio que Eu criei todas as coisas. Do nada, Eu trouxe a existência. Aqui, você encontrará aquilo que não se vê com os olhos e não se toca com as mãos, mas que molda toda a realidade – a essência, a verdade.
Jesus olhou para as montanhas ao longe, suas sombras alongadas e imponentes. Ali, no meio do nada, Ele sentiu o peso da missão que o aguardava. As multidões, as mãos estendidas, os olhares desesperados, as vozes clamando por socorro. Ele seria a esperança de muitos, mas para isso, precisava se esvaziar de tudo que fosse humano e se encher do propósito divino.
– Mas, Pai, como encontrar propósito onde só há silêncio? Como ser luz em meio a tanto vazio?
A resposta veio como um sopro de vento, movendo os grãos de areia aos seus pés:
– Porque é no silêncio que se ouve a minha voz. Aqui, no deserto, você aprenderá a escutar não apenas com os ouvidos, mas com o espírito. Você verá o invisível e se fortalecerá para suportar o peso da glória que virá.
Jesus fechou os olhos, deixando o silêncio preencher sua mente. Sabia que, para ser o Cordeiro, precisaria entender a profundidade do silêncio e a força do vazio. O deserto era apenas o início, mas já podia sentir que cada dia seria um passo mais próximo da cruz – e da eternidade que se seguiria.
E assim, enquanto o sol rasgava o horizonte com sua luz dourada, o primeiro dia se iniciou. O primeiro passo havia sido dado.
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